Melhorar as políticas de combate ao racismo e toda forma de discriminação e violência no Paraná. Com esse objetivo, a coordenadora do Grupo de Trabalho de Políticas Etnorraciais da Defensoria Pública da União (GTPE-DPU), Rita Cristina de Oliveira, solicitou à Comissão de Direitos Humanos e da Cidadania da Assembleia Legislativa (CDHC) a retomada das discussões sobre o Programa SOS Racismo, implantado pelo Governo do Estado em março de 2017.
Em reunião virtual realizada com os deputados Tadeu Veneri (PT) e Goura (PDT), presidente e membro da CDHC respectivamente, a defensora Rita falou da necessidade urgente de aprimorar o sistema com o estabelecimento de um fluxo eficiente de informações entre as instituições envolvidas; atualizar a legislação que criou o programa, visto que a lei é de 2005 e verificar a existência de materiais e ações educativas sobre racismo e discriminação ministradas a agentes públicos, bem como materiais orientativos sobre a utilização do programa SOS Racismo.
Rita Oliveira também sugeriu a realização de audiência pública com espaço para denúncias populares, com participação de diversas instituições com atuação temática para avaliação de propostas de aprimoramento do programa.
“Como vítima de caso de racismo e como articuladora institucional das políticas de
enfrentamento ao racismo, posso testemunhar, com qualificação técnica, que existe uma postura em alguns órgãos no sentido de desincentivar o registro dos casos; bem como para que não se dê andamento aos casos em prazo razoável e seus agentes não compreendem a gravidade estrutural desses casos, inclusive adotando postura flagrantemente benevolente nos relatórios e processamentos desses casos”, declarou Rita Oliveira.
Comissão de Direitos Humanos e da Cidadania
O presidente da Comissão, deputado Tadeu Veneri sugeriu ampliar a solicitação de dados também ao Sistema Prisional e ao Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial (CONSEPIR/PR). “Nós temos um sistema que prende muito, prende mal e prende errado. Se tivéssemos uma noção de quantas pessoas que estão presas respondem por crime de injuria racial, seria outro dado importante para compreendermos as falhas desse sistema”, afirmou.
O deputado Goura ressaltou a importância da realização de audiência pública para dar visibilidade ao assunto e buscar soluções ouvindo todas as instituições envolvidas bem como toda a sociedade. “O enfrentamento ao racismo e a qualquer tipo de discriminação passa, necessariamente, por uma escuta atenta dos sofrem esse tipo de crime”, argumentou.
Os parlamentares também farão a análise da Lei Estadual nº 14.938/2005, que cria o SOS Racismo, para propor alterações e atualizações no âmbito da Assembleia Legislativa.
Segundo análise preliminar da defensora, tanto a Lei 14.938/2005 quanto o decreto Estadual nº 5115/2016, que regulamentou o programa, têm diversas falhas que acabam ajudando a acentuar o déficit de apuração de denúncias
Dados
De 2016 a 2019 foram registrados 5.330 crimes de racismo e injúria racial no estado do Paraná (SESP). Desse total, conforme dados da Secretaria de Segurança Pública do Paraná, 4.929 casos se referem a crimes de injúria racial (art. 140, §3º do CP) e 404 a outros crimes de motivação racial.
Dentre os 404 casos citados, o maior número, 330, foi classificado como prática, indução ou incitação à discriminação ou preconceito. Outros casos citados com menor incidência são negar emprego ou trabalho, recusar venda, entrada em local comercial ou hospedagem, bem como impedir acesso a transporte público e acesso social a edifícios públicos ou residenciais, entre outros.
Já em relação ao número de inquéritos instaurados, concluídos e que viraram denúncias no mesmo período, os números são vagos. Conforme dados da Polícia Judiciária, em 2019 dos 583 casos instaurados, apenas 127 foram concluídos e 95 tornaram-se denúncias. Esses dados incluem crimes de injúria racial, sendo estes 536 dos 583 casos; prática de atos resultantes de preconceito e crimes de preconceito de raça ou de cor. Este último soma 46 casos dos quais cinco tornaram-se denúncias.
“Os dados apresentados pela SESP demonstram uma filtragem cada vez mais restrita desde os registros de ocorrências, que se sabem já são desestimulados, até o efetivo processamento em inquéritos relatados e com um número ínfimo de denúncias formuladas”, avaliou a defensora Rita.
Ela ressalta que o os dados apresentados pelo Tribunal de Justiça demonstram números ainda mais reduzidos de processos e inquéritos de apuração de casos de racismo e injúria racial no Paraná, sendo notável um número ainda menor dos que resultaram em ação penal.
Orientação e capacitação para atendimento
Outro apontamento feito pela coordenadora do GTPE/DPU foi a falta de uma polícia especializada para o tratamento desse tipo de crime no Estado. “Não se conhece iniciativas que capacitem os agentes e policiais civis para tratamento específico desses
casos, seja no sentido de compreender a gravidade do delito, seja para dar tratamento célere e comprometido aos processos”, afirmou Rita.
A necessidade de produção de materiais didáticos e ações educativas nas escolas e instituições de ensino também foi apontado como uma ação urgente a ser implementada.
“A ideia não é só aprimorar o Programa SOS Racismo, como de fato estabelecermos uma espécie de laboratório interinstitucional de observação e fiscalização do programa para que ele funcione também como uma espécie de banco de informações para formulação de políticas públicas”, finalizou.