“Reivindicamos moradia digna para todas e todos. Morar para dormir, morar para viver, morar para brincar, morar para comer, morar para trabalhar, morar para se registrar, morar para se cuidar, morar para ser!”
Esse trecho dá o tom do “Manifesto: Por uma Política Pública de Moradia Digna”, que foi divulgado, nesta sexta-feira (8), no encerramento da primeira Conferência Popular de Habitação de Curitiba e Região Metropolitana, em assembleia geral realizada na ocupação Nova Esperança.
O manifesto foi elaborado a partir das discussões realizadas durante os cinco dias do evento, que foi organizado por mais de 25 coletivos e mandatos engajados na causa e na construção de políticas públicas para habitação social.
O documento apresenta quatro propostas que foram classificadas como medidas urgentes. São elas:
1 – Elaboração de Plano Habitacional de Emergência para atendimento das famílias com situação de vulnerabilidade socioeconômica agravada, com medidas como aluguel social, locação social, entre outras;
2 – Respeitar todas as normativas judiciais e legislativas sobre despejos. Realizar a mediação e busca de soluções que garantam a moradia das famílias que estejam ocupando áreas públicas;
3 – Garantia de acesso aos serviços essências (água e energia elétrica) às ocupações.
4 – Uso dos instrumentos que já permitem regularização fundiária plena e gratuita das áreas habitadas pela população de baixa renda.
Outros três tópicos receberam destaque no manifesto: Legislação e Instrumentos Normativos; Gestão e Políticas Públicas, e Demandas das Comunidades.
Leia a íntegra do manifesto clicando na imagem abaixo:
Uma construção coletiva
Antes da conferência, foram realizadas quatro aulas-públicas prévias, transmitidas de maneira online. Durante o evento foram realizadas: uma audiência pública, uma palestra e quatro mesas temáticas com representantes da gestão pública, movimentos sociais, especialistas e lideranças comunitárias, além da coleta de contribuições aberta ao público.
É preciso garantir orçamento para habitação
O deputado estadual Goura (PDT) parabenizou todos os participantes e organizadores da conferência e avaliou como fundamental a criação de uma Secretaria Municipal de Habitação e a garantia de orçamento para moradia.
“É uma alegria chegar ao final dessa conferência e ver essa união em torno de um direito fundamental que é a moradia. Curitiba tem que ter uma Secretaria Municipal de Habitação. E nós temos que sair daqui com esse compromisso. Minha sugestão é levar esse documento aos prefeitos e ao governador. Eles têm que conhecer a realidade, colocar o pé na lama e ir até as ocupações”, afirmou Goura.
Além da participação nos eventos preparatórios da Conferência, Goura fez várias visitas a ocupações de Curitiba. Entre elas a Vila Joanita, as vilas que compõem o chamado Bolsão da Vila Formosa, as vilas da região do Ribeirão dos Padilhas e a Vila Baggio.
Goura também chamou a atenção para a Lei Orçamentária Anual (LOA) que será votada em breve na Câmara Municipal. “É ridículo que uma cidade com quase R$ 9 bilhões de orçamento coloque um valor ínfimo para habitação, algo em torno de 0,2%. Cadê o IPTU progressivo, o aluguel social?”, questionou.
De acordo com informações da Frente Mobiliza Curitiba, “desde a instituição da política habitacional do município de Curitiba em 1964 (Lei Municipal nº 2.515) e a criação da Companhia de Habitação Popular de Curitiba – COHAB-CT, os investimentos para a produção de habitação de interesse social e regularização fundiária nunca foram maiores que 0,2% ao ano do orçamento municipal”.
Ocupação Nova Esperança
Não por acaso o local escolhido para o encerramento da Conferência Popular de Habitação de Curitiba e Região Metropolitana foi a ocupação Nova Esperança, no município de Campo Magro.
A área da ocupação possui 42 alqueires e até 2009 abrigava o Centro de Atendimento Fazenda Solidariedade, que atendia dependentes químicos e pessoas em situação de rua.
Porém a Fundação de Ação Social (FAS) encerrou as atividades do Centro alegando alto custo de manutenção das atividades. Em 2012, a área foi concedida ao Governo do Estado para uso do Departamento Penitenciário (Depen), à época vinculado à Secretaria de Estado da Justiça.
Como a área estava abandonada, em 25 de maio de 2020, cerca de 600 famílias iniciaram a ocupação da fazenda, impulsionadas sobretudo pelas dificuldades geradas com a pandemia do Coronavírus, que gerou desemprego em massa e dificuldades para a manutenção do aluguel.
“Fizemos aqui um novo formato de ocupação, quebrando o preconceito de que o pobre não sabe cuidar do meio ambiente. Temos fossa ecológica em todas as casas. Não vaza nada nem para terra e nem para o aquífero”, afirmou Valdecir Ferreira, o Val, um dos coordenadores do Movimento Popular por Moradia (MPM).
“Aqui nós não desmatamos para construir. Temos casas entre o parque. Desde 25 de maio de 2020 até hoje fizemos 11 vilas com cerca de 100 famílias cada”, completou.
“Esse ambiente estava depredado, sem vida, sem água, sem energia. Fizemos uma biblioteca, uma padaria comunitária, uma cozinha comunitária, uma escola, barracão para esporte e lazer. Os locais são 100% funcionais e sem nenhum real de dinheiro público”, ressaltou Val ao observar que a Comunidade Nova Esperança está servindo de modelo para o Paraná e para o Brasil.
Repercussão nacional
Liderança histórica do Movimento Nacional de Luta pela Moradia, Hilma de Lourdes Santos, falou da importância da realização da Conferência Popular de Habitação.
“A Conferência foi um sucesso. O Brasil inteiro está vendo o que estamos fazendo. Tiram tudo de nós, mas estamos aqui para reivindicar mais uma vez nosso direito à moradia”, afirmou.
Hilma ressaltou que o momento exige ainda mais união e determinação. “Eu tenho quase 60 anos e ainda não tinha visto a fome da forma que estamos vendo hoje”, desabafou.
Também participaram da Assembleia Geral da Conferência Popular de Habitação, a vereadora Professora Josete (PT) e representantes dos mandatos da vereadora Carol Dartora (PT), do vereador Renato Freitas (PT), dos movimentos, organizações sociais e acadêmicas e coletivos que participaram da organização do evento.