“O setor econômico deveria vir conosco porque está vendo todos os dias os seus trabalhadores morrerem”. A afirmação foi feita pela procuradora-chefe do Ministério Público do Trabalho (MPT), Margaret Matos de Carvalho, durante reunião pública da Frente Parlamentar do Coronavírus da Assembleia Legislativa do Paraná, que discutiu a saúde a segurança dos trabalhadores em atividades essenciais na pandemia.
Para tirar a invisibilidade permanente que se impôs aos trabalhadores essenciais, que estão fora do grupo de prioridade da vacinação, é preciso transparência nos dados quanto à notificação de casos entre grupos de trabalhadoras (es); critérios rigorosos para definir quais são as atividades essenciais; fiscalização efetiva quanto ao cumprimento dos protocolos sanitários nas empresas e indústrias, e atuação concreta para reduzir a lotação no transporte coletivo.
Esses foram os principais apontamentos feitos pelos participantes da reunião, realizada por sugestão do deputado Goura, que atendeu a uma solicitação do Movimento Sindical do PDT no Paraná.
Realizada nesta quarta-feira (14), de modo remoto, a reunião pública contou com a participação de vários deputados que compõem a Frente, que é coordenada pelo deputado Michele Caputo (PSDB); do Ministério Público do Trabalho; do Fórum pela Liberdade Sindical; da Federação das Indústrias do Paraná (Fiep); da Secretaria de Justiça, Família e Trabalho; do Departamento Intersindical de Estudos e Estatísticas Socioeconômicas (Dieese), de entidades sindicais e do médico sanitarista, Zuher Handar.
Efeito nefasto aos trabalhadores
Representante do Fórum pela Liberdade Sindical do Paraná, o procurador do Ministério Público do Trabalho, Emiliano Alberto Oliveira, afirmou que os efeitos da pandemia para os trabalhadores e trabalhadoras de atividades essenciais têm sido muito nefastos.
“Não temos dados sobre onde essas contaminações ocorrem. Precisamos saber quem são os trabalhadores mais acometidos pela covid para que as respectivas entidades sindicais possam fazer um trabalho efetivo para garantir a segurança e os direitos desses trabalhadores”, afirmou Emiliano Oliveira, ao ressaltar a importância de se qualificar os boletins epidemiológicos.
Subnotificação da CAT
O preenchimento da Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) pelos trabalhadores que se contaminaram também foi destacado como fundamental para se ter informações sobre as contaminações. Porém, os representantes sindicais afirmaram que, embora a Justiça já tenha reconhecido a Covid-19 como doença do trabalho, na maioria das empresas isso não acontece.
“Temos denúncias de trabalhadores que voltaram ao trabalho com sequelas e foram dispensados. Ou seja, não há proteção de vida aos trabalhadores. Por que as empresas estatais querem esconder as notificações? Por que não querem fazer as CATs”, questionou o presidente do Movimento Sindical do PDT no Paraná, José Baka Filho.
Ele ponderou que se não há vacina suficiente é necessário fornecer formas de proteção aos trabalhadores e trabalhadoras que são chamados às atividades presenciais.
Invisibilidade permanente
O médico sanitarista e consultor em saúde do trabalhador, Zuher Handar, afirmou que a pandemia afetou de modo desigual diferentes grupos populacionais, porém pouco se produziu de evidências científicas sobre a saúde de trabalhadoras e trabalhadores porque a subnotificação compromete estratégias de enfrentamento.
“Existe uma invisibilidade permanente de trabalhadoras e trabalhadores essenciais como os da limpeza urbana, empregadas domésticas, entregadores, motoboys, caixas de supermercado, motoristas, trabalhadoras (es) da indústria de combustíveis, da indústria química produtora de matéria-prima para sanitizantes e medicamentos, dentre outros”, listou Handar.
O presidente da Força Sindical, Sérgio Burtka, também ressaltou a preocupação com a fiscalização e com a lotação do transporte coletivo, principal modal usado pelos trabalhadores.
Ampliação do rol de atividades essenciais é equivocada
A procuradora Margaret Matos Carvalho foi enfática ao afirmar que a definição das atividades essenciais é clara na legislação brasileira e ampliar o leque dessas atividades, como têm feito os governos Estadual e Federal, além de trazer implicações jurídicas quanto aos direitos dos trabalhadores, aumenta o risco de contaminação dificultando o controle da pandemia.
“A Lei de greve 7783/89 estabelece 15 atividades essenciais, que são aquelas que devem garantir a prestação de serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis. Porém, com o decreto do Governo do Estado subiu para 43 aqui no Paraná e com o decreto da prefeitura de Curitiba subiu para 53”, observou.
Para a procuradora, as entidades sindicais têm procurado mostrar que essa ampliação com o objetivo de exigir a continuidade dos trabalhos presenciais coloca em risco a saúde da população.
“O trabalhador adoece porque precisa ir trabalhar, mas na hora que adoece não tem nem leito, não tem o suporte que teria que ter. Então, não temos mais que discutir economia, mas sim a proteção à saúde do trabalhador”, frisou ela.
Margaret Matos destacou ainda o posicionamento da Organização Mundial da Saúde (OMS) de que a pandemia voltou a crescer, a necessidade de um lockdown efetivo e o cumprimento dos protocolos de segurança sanitária em todas as atividades essenciais.
“É preciso a garantia de distanciamento mínimo. As máscaras não podem ser qualquer uma, têm que ser do modelo PFF2. A testagem tem que ser semanal. Tem que aumentar a frota do transporte coletivo e bloquear assentos. E dentro de cada grupo de vacinação, temos que priorizar os trabalhadores em atividades essenciais”, pontuou.
Impactos da pandemia no bolso do trabalhador
Para o economista do Dieese, Sandro Silva, além da saúde, a pandemia afetou diretamente a renda do trabalhador. Além da redução dos postos de trabalho e dos salários, houve aumento da inflação. “Tivemos aumento da cesta básica, do gás de cozinha, das tarifas de água e esgoto”, citou.
“Vivemos o falso dilema entre economia e saúde. A situação ideal era ter uma vacina o mais rápido para todos e ao mesmo tempo um lockdown mais verdadeiro. Mas para isso, o Estado tem que dar suporte para o trabalhador ficar em casa”, ressaltou Sandro.
Manutenção na Repar e os riscos de aumento na contaminação
O presidente do Sindipetro Paraná e Santa Catarina, Alexandro Guilherme Jorge, aproveitou a reunião para falar sobre a preocupação com as condições de segurança na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), em Araucária, que tem previsão de uma parada de manutenção técnica. A unidade soma três mortes de trabalhadores por Covid-19 nos últimos dez dias e todos eram jovens.
“Com essa atividade, cerca de 2 mil trabalhadores serão acrescentados a uma rotina que já conta com 1200 trabalhadores. E pelo menos a metade desses trabalhadores vem de outros municípios. Já tivemos na refinaria de Betim, em Minas Gerais, um surto de 200 contaminados e 5 mortes. Aqui na Repar já tivemos 3 óbitos”, informou.
Além disso, Alexandro afirmou que a empresa não repassa nenhum dado sobre a situação da covid entre os trabalhadores.
“Se for permitido que se realize as atividades de manutenção como está programado, toda e qualquer outra atividade pode ser liberada. Porque essa atividade vai contra tudo o que está sendo pregado em termos de saúde na pandemia”, destacou.
Encaminhamentos
O coordenador da Frente, deputado Michele Caputo (PSDB), afirmou que o debate é necessário para preservar vidas. “Hoje discutimos a segurança dos trabalhadores em atividades essenciais. Recebemos informações de mais casos e óbitos. O trabalhador é a grande massa ativa, que usa o transporte público e não pode ficar em casa por trabalhar em atividades essenciais. A vacinação está aquém do que se precisa. O SUS consegue vacinar, o que precisamos é de mais doses”, disse o deputado.
O deputado Professor Lemos afirmou que “é preciso superar essas limitações políticas para termos acesso às vacinas. O Governo do Paraná poderia ter se associado a outros estados para adquirir vacinas”.
Por fim, Lemos ressaltou que todos os apontamentos feitos durante a reunião constarão em ata e receberão os devidos encaminhamentos pela Frente Parlamentar do Coronavírus.
Participaram do encontro os deputados Professor Lemos (PT), Arilson Chiorato (PT), Luciana Rafagnin (PT), Evandro Estacho (PV), Alexandre Amaro (Republicanos), Soldado Fruet (PROS) e Cristina Silvestri (CDN).
Próxima reunião da frente será no dia 19
A próxima reunião da Frente acontece na segunda-feira (19) a partir das 9 horas e vai tratar da investigação de casos de “fura-fila” da vacina no estado.
Veja abaixo a íntegra da reunião pública da Frente Parlamentar do Coronavirus que discutiu a segurança e saúde dos trabalhadores essenciais na pandemia.